sexta-feira, 9 de julho de 2010

insônia

Abri meus olhos, mas era como se eu não tivesse aberto. Depois de uma longa noite lutando contra insônia, um breve sonho permeava minha mente. Não consegui decifrá-lo. De repente uma mulher, jovem e bela, de cabelos vermelhos, olhos castanhos e profundos (lindos olhos por sinal), branca e magra, vestida com um longo vestido de cor negra erguia seus braços em minha direção. Eu estava atônito, totalmente perplexo, mas aquilo me trazia uma paz incondicionalmente grande que nem eu sei explicar. Tive a impressão de já ter visto essa mulher em algum lugar, talvez até no meu subconsciente ou em outros sonhos. Sentia uma energia positiva vinda dela, uma energia que jamais teria sentido outra vez e muito menos sentira antes. Quando dei por mim já estava em seus braços e não queria mais sair daquele lugar. Numa tentativa frustrada de sair, acordei, era como se eu não tivesse acordado.
Levantei-me, abri a janela e um lindo dia me esperava. Ouvia pela janela o silêncio ensurdecedor daquela manhã, acompanhado de um ofuscante brilho do sol matinal. Mas uma coisa estranha mudara aquele dia: ele estava mais vermelho do que normalmente, símbolo da mulher misteriosa dos meus sonhos e de sua grande madeixa arruivada. Após tomar meu café da manhã respirei fundo para encarar mais um dia de minha monótona vida. Esse dia prometia fortes emoções.
Voltando a velha rotina: transporte, trabalho, cobrança, almoço, trabalho, bate-papo com os amigos e volta pra casa. Estava ansioso para reencontrar aquela mulher dos meus sonhos, certamente iria sonhar com ela novamente. Mesmo atolado de trabalhos fiz um esforço para tentar dormir mais cedo pois cada momento com ela era como se eu estivesse em paz comigo e com o mundo (até esquecer-lo totalmente em minha ilusão).
Deitei em minha cama, fechei os olhos, mas era como se ele estivessem abertos o dia todo pois não parei de pensar nela sequer um momento e isso ia me consumindo de uma maneira surreal. Antes do reencontro encontrei minha companheira fiel de todas as noites: a insônia (minhas olheiras não deixavam mentir). Mudava de posição na cama toda hora na esperança de encontrar a melhor para o encontro, mas nada, todas as tentativas eram em vão. Parecia que ela estava fugindo de mim e isso era estranho pois na noite anterior transparecia que a mulher misteriosa tinha um certo afeto por mim. Quando de repente me encontrei no mesmo local da noite anterior e lá estava ela idêntica a dos meus pensamentos.
Desta vez tomei coragem e cheguei bem perto dela, senti seu aroma das mais cheirosas flores do campo, agradabilíssimo cheiro, que me extasiava. Eu tremia copiosamente, minha mão suava demais, não conseguia falar sequer uma palavra, quando ela veio e falou em um tom harmonioso em meu ouvido:
- Não precisa ficar nervoso, eu sou a união de seus sentimentos e sei tudo que se passa dentro de ti – falou e calou-se logo depois.
- Eu não parei de pensar em você o dia inteiro, o que eu devo fazer para isso parar de acontecer?
- Eu sou a idealização de seus sentimentos e não é fácil me esquecer assim- disse ela em um tom mais ríspido.
- Não sei o que é, mas com você perto de mim eu me sinto em paz.
- Isso acontece quando um homem solitário se encontra com seus sentimentos, é o espaço que a solidão dá para que você busque fugir dela- exclamou.
Eu não queria fugir da solidão, é a minha fiel e confiável companheira, não podia abandoná-la de repente, seria uma grande traição. A solidão é o grande conforto do homem pois quando tudo e todos se vão, lá está ela, do seu lado, a única que não te abandona.
Amanheceu e o primeiro raio de sol do dia iluminou meu bagunçado quarto pela brecha deixada na janela, mas antes de eu acordar, a mulher chegou bem perto de mim, tocou em meu rosto e me deu um leve beijo na testa. Depois disso saiu vagarosamente e se perdeu na grande névoa que pairava no local. Acordei assustado depois do pulo que eu dei da cama e fui me olhar no espelho. No local onde a mulher misteriosa me beijou tinha uma mancha de batom, um batom vermelho vivo da cor de seus cabelos. O contato do real com o imaginário pode assustar, mas ele de fato existe.
A mancha não saíra de jeito nenhum, eu estava desesperado, como iria trabalhar com uma mancha de batom na testa? O que os outros iriam achar de mim? Seria ridicularizado por todos. Tomei meu café e seguiria para a “velha opinião formada sobre tudo”. Fechei a porta e chamei o elevador. Um mal súbito me tomou quando a porta do elevador se abriu: era ELA, a mulher dos meus sonhos, jovem e bela, de cabelos vermelhos, olhos castanhos e profundos (lindos olhos por sinal), branca e magra, vestida com um longo vestido de cor negra. Pasmo e bestificado, fiquei sem reação (acho que nem respirar eu conseguia). A porta já ia se fechando quando ela mesma a segurou. Eu momentaneamente pensei em sair correndo gritando feito um louco, mas não mais de desesperado e sim de felicidade pois encontrei a mulher dos meus sonhos, a que me traz paz e felicidade, a idealização de todos meus sentimentos.
Da mesma forma que eu me sentia feliz uma parte de mim tornava-se vazia, era a parte da solidão, quem eu estava começando a abandonar de fato (perdoe-me pela traição, amiga solidão, preciso fugir da tradição dos poetas sós, sem amor). Ela veio a mim com a mesma delicadeza dos meus sonhos, não me agüentava de felicidade, com um simples movimento tocou seus lábios em minha testa, como no sonho, e foi descendo, beijando a ponta do meu nariz, descendo mais até tocar seus lábios em meus lábios tornando aquele beijo libertador o melhor da minha vida (a daria antes por aquele beijo). O elevador fechou a porta e seguiu para seu destino. Quando abriu a porta novamente uma grande névoa acompanhada com uma luz que cegava os olhos, eu e ela, no mesmo local dos meus sonhos.
Acordei, abri meus olhos, mas era como se eu não tivesse aberto. Descobri onde o contato do real com o imaginário ocorre. Depois disso guardo esse local só pra mim e ela, Mademoiselle, a minha real idealização, minha paz, meu porto seguro (e até hoje não sei se vivo sonhando).



gostou? mas não é meu não, é de Artur Mota

4 comentários:

Beija-Flor disse...

nossa, quanto romantismo
gostei. a idealização do amor, que sempre chega.

amanda lee jones disse...

"que essa felicidade nos deixe com o coração disparado, mãos úmidas, olhos brilhantes e aquela fome incapaz de engolir qualquer coisa."

Rα i sα ~ disse...

ó, que lindo. quanto romantismo(2)
invejinha branca.

amanda lee jones disse...

nem há mais nada branco no meu mundo, ele colore tudo *-*